segunda-feira, 4 de junho de 2012

Ficção científica, narrativa inortodoxa e deuses do século XXX

        
      À beira de um colapso, estamos, diria um personagem de ficção científica. Mas não houve ficção que tenha chegado perto de imaginar que o macaco pós-moderno quer mais é tchu-tchá-tchá-tchu-tchu-tchá. E não há ficção capaz de adivinhar o que poderá vir depois disso.
 

Mas prever o futuro, bancar o profeta, talvez não seja tão difícil assim. Parece que o futuro tende a ser meio parecido com o passado. Com um pouco de imaginação, não é difícil visualizar um bando de símios ao redor da fogueira, entoando cânticos rituais primitivos que culminam numa enorme suruba. Seriam bons tempos, esses. Mais sinceros.
Neste exato momento, sexta-feira, os símios contemporâneos preparam-se para o ritual do pássaro de metal (aquele velho DC-3, abandonado à beira da RS 470). Tribos em torno de seus totens. Nada muito diferente, em essência.
E por falar em ancestrais e fogueiras, há um posto de gasolina naquelas bandas...
"Fogueira grande agrada os deuses!"
Mas, imaginem, o colapso nunca chega. É sempre promessa, desejo e sensação. É só aflição e caos, de geração em geração.
Em meio a essa divagação, o alto-falante informa:
- Atenção, passageiros! Dentro de dez minutos atingiremos a velocidade da luz. Nessa ocasião, é comum sentir enjoos ou náuseas. Afivelem os cintos de segurança e mantenham as poltronas na posição vertical.
O universo é caótico. Uma nuvem de caos absurdamente imprevisível. Quando chegamos perto de observar qualquer padrão de comportamento em sistemas complexos, como a Bolsa de Valores, a mãe Natureza (que já era senhora dos átomos, antes da questão piegas dos animais em extinção) nos prega uma peça e inverte os caminhos. Terabytes de cálculos em vão.
- Deixe essas coisas pra lá, amor. Vamos dormir um pouco!
Quanto ao futuro, desconfio de quem arrisca previsões. Mas ouço com atenção quem não se apega a detalhes, quem se propõe a falar de essências...
- Sim, amor. Já estou indo.
- Senhores passageiros, informamos que acabamos de ultrapassar a velocidade da luz. Nossa nave continuará orbitando o sol e nossos sensores continuarão apontados para a Terra. Informamos, ainda, que, segundo nossos cálculos, a humanidade acabou de entrar no século XXII. Lembramos a todos que, deste ponto em diante, não é mais possível obter reembolso dos valores investidos, uma vez que é impossível retornar os 90 anos percorridos nos últimos instantes. Já é possível soltar o cinto de segurança e reclinar a poltrona. Para chamar a comissária do bordo, pressione o botão laranja. A Timeline Viagens do Futuro agradece a preferência e deseja a todos uma boa viagem.
O sistema de som ambiente toca uma canção: “um amor assim delicado / você pega e despreza...”
Abril de 2013. Uma TV. Um noticiário. O apresentador fala sobre máquinas capazes de viajar no tempo. “Em menos de vinte anos... cientistas... consórcio internacional...”. Sono. Cama. Sonhos. Ruídos desconhecidos na rua. Passos. Pessoas. Celulares. “Amanhã é sábado...”
No outro lado da cidade uma igreja anuncia o fim dos tempos. Como sempre. Há uma pequena plateia de dez ou doze pessoas ouvindo atentamente as palavras de um pastor, que repete as palavras que ouvira de um mendigo na capital, que, por sua vez, acredita tê-las recebido de um anjo com nome hebraico, difícil de pronunciar.
Pensando bem, essa sensação (de fim dos tempos) é perene. Talvez tenha a ver com aquela bobagem de “instinto de morte” de que Freud, se não me engano, falava. Se houver um “fim dos tempos”, possivelmente seremos os seus autores (mas isso também é lugar-comum. Preciso mesmo dormir um pouco.)
Ao redor do sol, a nave, com seus cento e quarenta e quatro passageiros e sua tripulação robotizada, continua a orbitar numa velocidade absurda. O tempo e o espaço em torno se comprimem e a humanidade conhecida vai ficando para trás.
- Atenção passageiros com destino ao ano 2916. Dirijam-se às cápsulas de desembarque em 10 minutos. Passageiros com destino a 2916 – cápsulas de desembarque. Obrigado.
As cápsulas são lançadas da nave em direção à orbita da Terra. Elas são programadas para reduzir a velocidade durante o trajeto, de modo a orbitar o planeta em velocidade normal. Automaticamente, a cápsula entra na atmosfera e aterrissa numa plataforma de desembarque da Timeline Viagens do Futuro.
A porta se abre lentamente. O pequeno grupo de viajantes, perplexos, olha para fora da nave, com medo do que podem ver. Mas não há nada de assustador. Ainda existem seres humanos (os pastores estavam errados), e um grupo deles (dos humanos), provavelmente da Companhia, está em frente à nave, dando as boas vindas aos viajantes, cantando e dançando.
- Não sei direito o que mudou nesses 900 anos, mas ao menos nos livramos daquele tal de tchu-tchá-tchá-tchu-tchu-tchá.
Ao ouvir isso, um dos dançarinos da empresa para de dançar, olha fixamente nos olhos do passageiro e declara com ar de espanto:
- Vocês conheceram o poderoso deus Tchu-tchá-tchá-tchu-tchu-tchá!!
        E todos curvaram-se diante dos viajantes do tempo.

2 comentários:

  1. Hahahaha! Dei risada.
    Mas, agora sério, alguém me explica que porra de tchutchação é essa?

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  2. kkk, procura no Google, amigo símio! Você vai se arrepender, mas tudo bem...

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