sexta-feira, 13 de maio de 2011

Storie e racconti II - Gente que faz

A nossa região é conhecida em todo universo pela absurda aptidão da nossa gente para o trabalho. E também pelo frio. E pelo vinho, em alguns municípios. Quando pensei em gente trabalhadora, frio e vinho, lembrei-me logo de uma história contada, há vários anos, por um então professor do Senai. Ele não é exatamente um "nono", mas é uma figura muito inteligente e simpática. E tem estrada. Só vou dizer que esse cara, na sua juventude, chegou a trabalhar no setor de engenharia da Tramontina, no tempo do epa, quando, para fazer uma simples cópia de um desenho (o que custava uma fortuna), necessitava-se de mão de obra altamente especializada, produtos químicos e equipamentos alienígenas.


EU TRABALHEI NA ENGENHARIA DA TRAMONTINA
(História contada há anos, por um então professor do Senai)

Mas isso foi há muito tempo. Nem vou dizer quando para não ficar feio. Mas digo que, naquele tempo, projetar e colocar no papel um simples desenho de uma lâmina de uma faquinha qualquer, não era brincadeira. Como diz a gurizada de hoje: era foda. O computador só veio alguns anos depois e, mesmo assim, sua aplicação era bem limitada.

Bem, mas vamos aos fatos. Trabalhávamos numa sala, em três pessoas. Lá havia aquelas mesas de desenho enormes, magníficas, cada uma com uma tonelada de equipamentos para o desenhista utilizar, papel, tudo. Era quase que uma sala ultra-secreta. Quase ninguém entrava lá. Para falar a verdade, se você não fosse atento, apanhava para achar o caminho. Lá também havia uma prateleira com diversos recipientes que continham produtos químicos utilizados para, entre outras coisas, copiar os desenhos. Era um processo interessante, qualquer dia eu falo sobre isso...

Aquilo tudo era no tempo da máquina de escrever e do ponto com cartão perfurado, mas, apesar de tudo, aquela época tinha as suas elegâncias. Havia, por exemplo, a sempre necessária garrafa térmica com café. Desde lá até os dias de hoje, o único setor de qualquer empresa que não é movido a café é, sem dúvida, o chão de fábrica. Fora esse, era capaz de ter uma garrafa de café até na salinha de ferramentas do jardineiro.


E, apesar de estarmos falando em tempos do epa, também havia modernidades. Sabe aquela mania de organização que faz o pessoal sair colocando etiqueta por todo o lado? Naquela época já tinha disso. Acima do bebedor havia uma identificação bem visível: BEBEDOR. Nos ramais de telefone de toda a empresa tinha que ter a identificação: TELEFONE. Será que tinham medo que alguém não soubesse o que era um telefone? Seria cômico se não fosse trágico. Parecia que haviam descoberto o alfabeto. CARTÃO PONTO, VASSOURA, LIXO, GAVETA, PRATELEIRA, RELÓGIO... Só faltava identificarem as portas e as janelas...


Na nossa salinha não era diferente. Mas havia um porém: algumas coisas precisavam realmente de identificação. Era o caso dos químicos na prateleira. Cada recipiente estava identificado com a descrição do conteúdo, e os mais perigosos traziam a temerária e universal caveirinha, mostrando tratar-se de algo venenoso. Lembram daquela aula do Seu Madruga na escola do Professor Girafales? “Quando virem esse símbolo, não bebam!”


Naquele momento da empresa, o nosso principal desafio, enquanto engenharia, era conseguir não passar frio no inverno. Nos reunimos, fizemos um brainstorming e descobrimos que a melhor alternativa seria adicionar graspa ao café que consumíamos. A partir de então o problema passou a ser o seguinte: como fazer entrar e permanecer na empresa, na nossa salinha, uma garrafa de graspa, sem que ninguém percebesse? De vez em quando rolava uma espécie de “auditoria”, por isso, simplesmente esconder a garrafa em qualquer lugar era inviável. Alguém fatalmente a encontraria.


A solução foi encontrada por um colega nosso que, numa manhã de domingo, teve uma visão inspirada. Ele pensou em esconder a graspa na prateleira dos químicos, num recipiente idêntico. Na segunda-feira ele providenciou um recipiente novo, a caveirinha e a devida identificação. A partir de então passou a figurar mais um químico na nossa sala. A identificação dizia: CUIDADO – ÁCIDO GRASPÓLICO.


Assim, consumimos em segredo, durante vários invernos, o nosso divino café com graspa.

3 comentários:

  1. Hahahaha! Muito bom!
    Acho que o mais legal ainda é pensar na utilização bisogna do tal sistema "5 S" japa. Faltou também identificar: colaborador.
    Abraço símio,
    A

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  2. Cedenir, eu vivi nessa época e trabalhei por lá... parece que estou vendo o cenário que voce descreveu. Obrigado menino. Um abraço. Neusinha.

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  3. Oi, Neusa. Obrigado por visitar o Macaco.

    Trocando experiências: eu trabalhei por alí em outras épocas, mas o cenário parece não mudar nunca... a não ser pela graspa que, atualmente, duvido que entre lá!

    Abraços!

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