sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O salário dos deputados

Sei que a reflexão é tardia, mas é interessante. 

Estava em casa apreciando meu momento de ócio com alguns amigos. Cerveja na mão. Televisão ligada. Uma partida de futebol. 

Como eu entendo muito de futebol, estava prestando atenção em outras coisas: na propaganda da cerveja (aquela que faz um barulhinho que lembra xixi caindo no vaso), no patrocinador que ornamentava a bunda do árbitro (a Lupo), naqueles logotipos da Coca-Cola que dão a impressão de estarem de pé ao lado das goleiras, e na alegria dos torcedores. Nem sei quem estava jogando. Eram os amarelos contra os brancos (não as etnias), e também não lembro ao certo o placar. Era uma tabuada do dois.

Alguém falou do salário dos deputados - aqueles filhos da puta. Arrisquei-me a pedir quanto os filhos da puta que jogam futebol recebem. Após uma breve reflexão, alguém declara: "o Ronaldinho deve ganhar em torno de 11 milhões por mês, só que não sou eu que pago" (não, são os Illuminati, que conseguem dinheiro repassando o e-mail da menina cega com câncer).

Sorvi um gole da minha cerveja, lembrei-me das minhas meias Lupo na gaveta do armário e da "Coca-Cola nossa de cada dia" na geladeira. Lembrei também do vendedor de melancias gremista que tentou me lograr no troco e que se vangloriava por ter uma "camisa oficial".

- Que bom que os únicos filhos da puta do Brasil  são os políticos. 

***

Certamente o famigerado salário dos deputados é um absurdo - só que o salário de um ronaldinho também  é! Mas disso ninguém reclama! Quando vira notícia é transformado em algo bom, pra torcedor sentir orgulho do seu clube. É transformado num exemplo de garra e superação, num mito e toda aquela balela que serve para tentar justificar uma renda absurda. 

Um mundo onde um jogador de futebol vale mais do que qualquer outro profissional só pode ser um mundo muito doente. E não será a extinção dos políticos a cura. Nós assistimos a esse espetáculo, pagamos ingresso, pagamos tributo aos  patrocinadores, sonhamos com o tênis de 700 pilas. Chamamos isso de arte.

Daqui a quatro anos talvez a cena se repita, mas o grosso do eleitorado estará mesmo  preocupado com o destino do Ronaldinho, com o paredão do BBB ou com as metas da empresa onde trabalha como um escravo. Até aqui nada de novo. Enquanto houver televisão para dizer-nos o que dizer e futebol para discutirmos, estaremos livres desses problemas complicados. Eles devem ser discutidos pelos políticos numa eterna pelada sem campo, sem árbitro e sem torcedores. Nos disseram que é assim que deve ser: "Falem do Tiririca", "falem do salário dos deputados", "agora, voltem a falar de futebol. O Jornal Nacional fica por aqui. Boa noite e até amanhã!".

Pronto. Acabei de atender ao apelo.

Um comentário:

  1. Cede, daqui a quatro anos isso vai certamente se repetir. Daqui a um ano também. Amanhã também.
    Falando nisso, amanhã de noite tem novela, e, como você sabe, ela resolve todos os problemas do mundo, então fique tranquilo e pare de querer matar deputados e jogadores, tadinhos.
    Ab,
    A.

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